Aborto: Chances de acontecer novamente
Hoje eu trouxe uma convidada especial para falar de um assunto complicado: o aborto.
Vamos falar das chances de um aborto acontecer alguma vez e de acontecer novamente com a Dra Marcia Riboldi, geneticista da Igenomix.
Abortar é comum?
Infelizmente o risco de um aborto acontecer naturalmente é muito comum. Na medicina acreditamos que a maioria das mulheres em algum momento, inclusive sem perceber, já teve algum aborto antes mesmo de saber que havia engravidado.
Na verdade, um primeiro abortamento normalmente acontece por um processo do organismo que não está muito bem preparado, processos imunológicos, uma falha no desenvolvimento do próprio embrião, por exemplo.
O que devemos estar atentas ao sofrer um primeiro aborto é sobre sua possível relação com a idade da materna e a semana em que essa perda aconteceu, por exemplo as perdas que ocorrem no primeiro trimestre são mais comuns e normalmente se relacionam com alterações que não têm porque acontecerem novamente. Agora, se há uma repetição, então é preciso se preocupar.
Qual é a relação entre o aborto e a idade da mãe?
A idade é super importante, para entender é preciso lembrar que as mulheres nascem com seu estoque de óvulos. Estas células vão envelhecendo junto com a gente, 37 anos, por exemplo pode não ser muito para uma pessoa, mas para esta célula que será responsável para gerar uma vida, isso é bastante e acaba afetando a capacidade de gerar um embrião.
Se eu tiver um aborto com 38 anos, por exemplo, e a gente estudou o produto desse aborto confirmando que esta perda foi causada por uma alteração cromossômica, sabemos que a chance de acontecer novamente é maior.
Um aborto com 30 anos é uma coisa, pode ser por vários fatores e a chance de ser por razões cromossômicas é mais baixa, agora, em um aborto com 38-40 anos a chance da causa ser cromossômica pode chegar a 80%.
Acontece a mesma coisa com os homens? Porque apesar deles estarem produzindo espermatozoides constantemente, são homens mais velhos produzindo espermatozoides, não?
Muito boa pergunta porque até poucos anos atrás o homem não era estudado, não era lembrado e o foco estava apenas na mulher. Mas ultimamente estão sendo publicadas muitas pesquisas científicas que demonstram que a idade do homem também pode aumentar o risco de alterações genéticas nos recém-nascidos, síndromes, até mesmo um risco de autismo e epilepsia, que antes não se sabia.
Mas o que se pode fazer para prevenir? Você me perguntaria. Então, caso a ideia é ter filhos em uma idade mais avançada, assim como hoje em dia se fala muito em congelamento de óvulos, também estamos começando a pensar no congelamento de espermatozoides.
Essa questão da idade materna e paterna não se falava antes também porque as gerações anteriores engravidavam cedo, estes problemas eram menos frequentes e quando ocorriam, não eram comentados pelas pessoas que passavam por estas dificuldades.
Qual é o limite de idade da mulher para não ter um alto risco de aborto?
Até os 30 anos não muda muita coisa, mas a partir deste ponto a coisa vai acontecendo como se fosse descer um degrau por vez entre os 30 e 35 e até mesmo até os 37. Quando a gente chega nos 38 anos esta descida começa a ser muito mais representativa, como se fossem uns 5 degraus por vez. Então, apesar de por fora estar tudo bem e continuamos lindas e muito bem conservadas, não existe uma forma de conseguir conservar esta mesma plenitude com os óvulos e eles acabam envelhecendo com duas consequências muito sérias:
- Aumento do risco de aborto
- Aumento do risco de síndromes genéticas
Estes dois riscos são algo que devemos nos preocupar muito porque nem sempre um aborto é algo sem consequências para o corpo, como no caso de uma perda no comecinho da gestação, onde o feto ou embrião pode ser expelido naturalmente em casa ou é feita uma curetagem simples e tudo continua bem. Porém, às vezes um aborto pode ter uma complicação e prejudicar o útero ou o endométrio (tecido que reveste a parede interna do útero onde o embrião se implanta).
No caso das síndromes, a grande maioria delas acaba provocando abortos ou o nascimento do bebê que vêm a óbito pouco tempo depois de nascer. Também é possível sobreviver e ter uma vida normal portando alguma síndrome, como pode acontecer com a Síndrome de Down, mas não podemos saber antes todas as consequências e complicações da própria Síndrome de Down, já que isso varia muito de pessoa para pessoa.
Só devo investigar o aborto após 2 perdas?
A literatura médica diz que sim, mas isso também varia com a idade, além disso, hoje com os recursos de diagnósticos mais avançados, se em uma primeira perda é identificada a causa, isso já pode prevenir a repetição. Por exemplo, se sei que existe uma alteração cromossômica como causa, pode ser feita uma indicação para prevenir alterações cromossômicas através de um tratamento de Fertilização in vitro com o estudo genético dos embriões.
Existe diferença entre alteração cromossômica e doença genética?
Sim, muitas diferenças. Vou explicar com uma analogia: Uma célula é como um ovo, tem a clara e tem a gema, que seria o núcleo dessa célula. Dentro desse núcleo a gente tem os cromossomos. Os óvulos das mulheres são células que dentro delas estão contidos 23 pares de cromossomos. Os espermatozoides produzidos pelos homens também têm 23 pares de cromossomos.
Na fecundação, quando o óvulo é fecundado pelo espermatozoide, é gerado um embrião que será um dia uma pessoa, que também terá 23 pares de cromossomos, ou seja, 46. Os cromossomos do sexo feminino são XX e do sexo masculino XY. Uma curiosidade sobre isso é que quem determina o sexo é sempre o espermatozoide.
Dentro dos cromossomos estão os genes. Cada cromossomo tem milhões de genes. Quando falamos de síndromes genéticas, como Síndrome de Down, Edwards, Patau, Willians, microdeleções e etc, estamos falando de cromossomos. Nestes casos que citei existe um ganho ou uma perda completa ou parcial de algum cromossomo.
Quando falamos de doenças genéticas, por exemplo, fibrose cística, anemia falciforme, hemofilia, doença de Huntington, atrofia espinhal, enfim, existe milhões de doenças genéticas que são decorrentes de uma mutação genética, quer dizer, um erro em um gene, ou às vezes em mais de um. O erro está dentro do cromossomo, mas o cromossomo pode estar inteiro e normal. Estas doenças que citei estão no nível dos genes que estão dentro dos cromossomos, ou seja, no nosso DNA.
A Igenomix avalia o que? Os genes ou os cromossomos?
A gente avalia as duas coisas em diferentes tipos de testes. O estudo do aborto que falamos agora, por exemplo, estuda o cariótipo, então estamos falando de cromossomos. Mas também podem ser realizados testes genéticos para rastrear mutações genéticas no casal que poderiam causar doenças genéticas nos futuros filhos ou ainda, poderia ser realizado um diagnóstico no embrião quando já se sabe que existe uma doença genética concreta que se pretende evitar.
Em todos estes casos é muito importante um aconselhamento genético para tirar as dúvidas, para saber se o teste é indicado e possível para cada família. Porque fazemos muitos testes de forma personalizada, por exemplo, se eu e meu marido queremos evitar uma doença genética e você e seu marido também querem, tudo será diferente para cada um de nós, os protocolos, os tratamentos, tudo é específico.
Como é esse processo de evitar uma doença hereditária?
Vamos imaginar que você teve a indicação de realizar um tratamento para prevenir uma doença genética específica presente na sua família ou que você detectou através de um teste de compatibilidade genética. Este processo de prevenir doenças hereditárias exige uma Fertilização in Vitro (FIV) porque essa é a única forma de ter acesso ao embrião antes da gravidez acontecer.
O primeiro passo é um estudo no casal, primeiro para identificar a mutação genética que será evitada e construir uma sonda que irá identificar esse erro genético nos embriões que serão gerados na FIV. Primeiro é realizada a sonda, para ter certeza que no caso da sua família é possível identificar a doença no embrião, tendo essa confirmação, então começa o tratamento de FIV com a estimulação do seu ovário para produzir mais óvulos e ter mais embriões para analisar através de um teste que se chama PGT-M (teste genético pré-implantacional para doenças monogênicas).
O que a gente recomenda é ter como mínimo 4 embriões para analisar, porque existem 3 tipos de doenças monogênicas: As doenças recessivas, as doenças dominantes e as doenças ligadas ao cromossomo X.
Nas doenças recessivas, estamos falando de 25% de chance de um embrião afetado. Neste caso a chance de ter embriões livres da doença é maior. Nas doenças dominantes, o risco de um embrião afetado é de 50%, então se temos 4 embriões, temos mais chances de ter embriões livres da doença. Fazer o estudo com menos embriões é possível, mas existe o risco alto de não conseguir embriões saudáveis para transferir ao útero materno no final do processo.
Ou seja, às vezes vale a pena antes de fazer o estudo genético acumular embriões fazendo mais de um ciclo de estimulação e fertilização de óvulos.
Quer que eu te conte?
Assista a entrevista em vídeo:
Sou Monica Romeiro, mãe do Lucas e da Larissa. Amo compartilhar minhas experiências e passar informações corretas e seguras para as mulheres que sonham em engravidar, para gestantes e para mamães. Convido você a conhecer meu blog e canal no YouTube.
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